![]() |
Brasileiros no exterior são menos organizados do que outros grupos estrangeiros, diz pesquisadora |
Alessandra Corrêa
De Nova York BBC Brasil
Desde os anos 1980, quando
hiperinflação, desemprego e baixos salários impulsionaram a primeira grande
leva de emigrantes a deixar o Brasil em busca de oportunidades no exterior,
milhões de brasileiros rumaram para países como EUA, Inglaterra, Portugal,
Espanha, Itália e Japão.
A evolução do perfil desses
imigrantes - e das comunidades que formam no exterior - é o tema do livro
Goodbye, Brazil: Émigrés from the Land of Soccer and Samba, que acaba de ser
lançado nos EUA pela antropóloga americana Maxine Margolis e deve chegar ao
mercado brasileiro no segundo semestre, com o título Goodbye, Brasil:
Emigrantes Brasileiros no Mundo.
Professora emérita da
Universidade da Flórida, Margolis é pioneira no estudo de imigrantes brasileiros
e uma das maiores autoridades do mundo no assunto.
Começou a estudar os brasileiros
que viviam nos EUA em 1989 e tem outros dois livros sobre o tema: Little
Brazil: Imigrantes brasileiros em Nova York, de 1994, e An Invisible Minority:
Brazilians in New York City (Uma Minoria Invisível: Brasileiros em Nova York,
em tradução livre), de 1998.
No novo livro, ela diz que
resolveu compilar pesquisas de diversos acadêmicos para traçar um panorama
global da diáspora brasileira. Além de EUA e Europa, o livro aborda as
comunidades de brasileiros no Japão, Austrália, Nova Zelândia e países
latino-americanos.
Margolis diz que, com a crise nos
países desenvolvidos, hoje há mais brasileiros retornando ao país do que indo
ao exterior. O Itamaraty calcula em cerca de 30% a redução do número de
brasileiros no exterior desde 2008, apesar de afirmar que é difícil chegar a
números exatos, em parte devido ao fato de muitos estarem em situação
irregular.
Segundo a antropóloga, os que
permanecem no exterior ainda são a "minoria invisível" que ela
abordava em seus trabalhos anteriores. Leia os principais trechos da entrevista
que Margolis concedeu à BBC Brasil em Nova York, onde mora.
BBC Brasil - A senhora se dedica
há mais de 20 anos a estudar os imigrantes brasileiros. Como o perfil desses
imigrantes evoluiu?
![]() |
Maxine Margolis é autora de vários livros sobre imigrantes brasileiros |
Maxine Margolis - Na década de 90
a grande maioria era das classes média e média baixa. Tinham estudado mais que
a média da população brasileira. Encontrei muitos que tinham educação
universitária. De 2000 para cá, baixou o nível educacional.
Nos EUA, na década de 90 a grande
maioria chegava de avião, com visto de turismo. Depois de 2001, ficou mais e
mais difícil conseguir um visto de turismo, por causa do 11 de Setembro. Então,
a classe mais baixa que queria "fazer a América" chegou via México,
com a ajuda de "coiotes", atravessadores.
Antes, a maioria dos imigrantes
brasileiros nos EUA vinha de grandes cidades. A partir de 2000, chegaram
brasileiros vindos da zona rural. Hoje em dia, há muitos de Rondônia, Acre,
Goiás.
(Seu perfil) é mais ou menos o
mesmo. poucos estão chegando, há mais brasileiros saindo, por causa da recessão
nos EUA e na Europa e porque talvez tenham mais oportunidades no Brasil, devido
ao crescimento da economia.
Que impacto a crise mundial e o
bom desempenho da economia do Brasil tiveram sobre os imigrantes brasileiros?
Margolis - Impactou muito, tanto
nos EUA quanto na Europa e no Japão. Na Europa, principalmente em Portugal e
Espanha. Antes, brasileiros nos EUA diziam que em uma semana aqui ganhavam o
equivalente a quatro semanas no Brasil. Até 1994, deixavam o Brasil
principalmente por causa da hiperinflação, mas também de desemprego, salários
baixos, alto custo de vida.
Acho que o catalisador foi que os
brasileiros bem estudados não conseguiam achar empregos nas suas áreas no
Brasil que pagassem salários para manter o estilo de vida da classe média. Nos
EUA, ganhavam salários melhores, mesmo fazendo faxina.
No Japão, a maioria dos
imigrantes está lá legalmente. Trabalham em fábricas, em empregos que os
japoneses não querem. Lá, na década de 90, ganhavam até mais, cinco vezes o que
ganhariam no Brasil.
Também acho que acima de 90% dos
brasileiros chegaram aqui, na Europa e no Japão com a ideia de voltar depois de
três, quatro anos. Aqui, a grande maioria diz que os EUA são lugar para
trabalhar, e o Brasil é lugar para morar. Mas muitas vezes acabam adiando, mais
um ano, mais um ano, e logo são 20 anos. Mas nunca sai da cabeça a ideia de um
dia voltar.
A senhora afirma que a sociedade
formada por brasileiros no exterior é caracterizada pela falta de instituições
de base comunitária bem desenvolvidas. Por que isso ocorre?
Margolis - Os brasileiros são
muito menos organizados do que outros grupos de imigrantes, como coreanos, por
exemplo. Mas acho que um dos principais motivos é porque já chegam ao país de
destino achando que vão voltar ao Brasil. E pensam: "Por que perder
tempo?" (formando associações e se organizando). Seu objetivo é ganhar
dinheiro e sair.
Mas mesmo no Brasil, há muito
menos associações do que nos EUA, por exemplo. Tenho um amigo americano que
sempre diz que no Brasil não há clubes de jardinagem, clubes de culinária,
clubes de leitura, não como nos EUA. Então, quando chegam aqui é a mesma coisa.
Em seus trabalhos anteriores, a
senhora destacava a invisibilidade dos brasileiros no exterior - o fato de que,
apesar de estarem por toda parte, não se organizavam em grupos nem apareciam
nas estatísticas. Isso ainda é uma marca desses imigrantes?
Margolis - Sim. São invisíveis.
Acho que por três motivos. Nos EUA, essa invisibilidade vem primeiro da
ignorância americana, que não entendem que os brasileiros não falam espanhol e
não são hispânicos, por exemplo. Segundo, no Censo americano não há um lugar
onde escrever "brasileiro". Se fizer um X ao lado de latino e
escrever "brasileiro", não vai ser computado assim. E também porque
grande parte dos brasileiros estão nos EUA ilegalmente, não querem preencher
formulários, participar do Censo.
Eles também são invisíveis na
Inglaterra, na Espanha. Mas em Portugal, de jeito nenhum. Quando um brasileiro
fala português lá, na hora se sabe que é brasileiro. E também Portugal é um dos
poucos lugares em que brasileiros com alto nível de educação conseguem achar
empregos nas suas áreas. E como é um país pequeno, a visibilidade dos
brasileiros lá é maior do que em outros lugares.
BBC Brasil - No seu novo livro a
senhora aborda também a questão das novas gerações, filhos de imigrantes
brasileiros que muitas vezes não têm qualquer familiaridade com o país natal
dos pais. Quais as perspectivas para essas novas gerações?
Margolis - Alguns pesquisadores
dizem que a segunda geração vai ser exatamente igual a seus pais. Dizem que não
dão muito valor à educação, querem terminar apenas o Ensino Médio e começar a
trabalhar. Mas outros pesquisadores dizem que não. Não há consenso. Uma amiga socióloga
diz que a ignorância da segunda geração sobre o Brasil é incrível. Eles não
conhecem o Brasil. Se os pais estão aqui ilegalmente, nunca viajaram para lá.
Mas ainda é muito cedo para saber
o que vai acontecer, se os brasileiros da segunda geração nos EUA serão
brasileiros-americanos ou apenas americanos.
0 comentários :
Postar um comentário
Obrigado pela participação!